segunda-feira, agosto 07, 2006

A moça retrato da lua

"Entre os Uananas (da tribo linguística dos Tucano) apareceu, contam, há muito tempo já, uma moça bonita como a Lua.
Os moços eram todos doidos por ela. Ela era alegre com eles, não amava deles nenhum só. Ria, dançava, conversava com eles, adoçava o coração deles, quando eles falavam em casar com ela, não respondia.
Um moço filho de tuixaua queria casar com ela, ela respondeu:
- Não posso casar contigo porque não sou filha de tuixiaua.
Quando não dançava, a moça à meia-noite costumava sumir-se de casa. Ninguém sabia para onde ia.
Os moços se juntaram, disseram:
- Vamos ver aonde esta moça costuma ir à meia-noite. Se ela vai ter com um homem, mataremos seu amante.
Um luar, quando noite estava como dia, a moça saiu de csa, foi direto paraa cachoeira.
Os moços foram atrás.
Quando ela chegou lá sentou-se em cima de uma pedra, depois virou o rosto para o céu, direito na lua.
Os moços foram chegando para junto dela. Então viram já o retrato da lua brilhando no rosto dela. Conforme no céu a Lua.
Os moços estavam sem fôlego. O coração deles tremia, seus olhos dançavam diante do fogo da Lua, não podiam falar!
Quando a Lua já foi virando para o outro lado, todos os moços viram descer do céu uma moça bonita como a mesma Lua. Essa Uanana levantou-se, aí viram então que era um moço!"

O moço retrato do Sol

As moças ficaram ficaram todas loucas por aquele moço, que brilhava como a Lua. E ficaram todas jogando conversa fora. Uma delas disse:
- Como não sinto sempre meu coração alegre como hoje, vou contar pra vocês uma história da Lua. É assim:
Antigamente havia na raiz do céu uma terra onde toda a gente era bonita. No meio dela havia um moço bonito como o Sol. Toda a moça dessa terra amava esse moço, que era um pouco pajé. Todas as noites ele ia para o porto sentar-se em cima da areia, aí mesmo as moças iam ter com ele. Seu coração, por isso, ficou contra as moças. Triste, ele as olhava à meia-noite, e elas voltavam para casa. Ele ficava lá. As moças não sabiam o que fazer para agradá-lo. Uma vez as moças disseram: "uma de cada vez vai agora para o porto, assim talvez o moço queira uma de nós".
Assim fizeram. A moça foi ter com o moço, abraçou-o, beijou-lhe a boca, fez-lhe cócegas, mas o moço não fez nada. Ele só olhou para ela. No meio desta noite a moça voltou. Na noite seguinte foi outra moça, e o mesmo aconteceu.
Já porção de luas depois, contam, elas se reuniram e disseram:
"Vamos agora cada uma por sua vez fazê-lo dormir à força conosco".
"Quem irá começar?"
"Eu! Se não me quiser eu me jogo no rio!"
- Todas disseram logo:
"Pois sim! Uma de nós há de ir contigo para espiar de longe como hão de passar."
Com a noite, o moço foi para o porto e logo atrás dele foi só a mocinha. Quando ele perguntou por suas companheiras ela respondeu que haviam ficado em casa.
"Por que vieste então?"
"Eu vim porque te amo."
"E por que me amas?"
"Eu te amo porque tu és o meu coração."
"Se eu disser que não podes me amar, tu te calarias, então?"
"Eu calo".
"Então ouve: Eu não cresci junto de vocês. Eu sou de longe, por isso vocês não sabem como eu sou. Vocês todas andam atrás de mim. Vocês todas querem casar comigo. Como tu dissestes que não contas meu segredo, vou te mostrar como sou"
- Ele tirou seu cueiro e disse:
"Repara, sou será homem! Sou será mulher!"
E ela não viu mais nada. Correu para o rio e atirou-se.
Quando as companheiras a tiraram do rio, ele beijou-lhe a boca e falou no seu ouvido:
"Tu viste, eu não sou homem, não sou mulher! Esconde bem no coração o que viste".
As moças imediatamente levaram essa sua companhira para casa. No dia seguinte perguntaram:
"Ele não te quis, será?"
"Não"
Doida e triste, a mocinha olhava para o moço. E todas as noites seguiu-se a mesma história. E todas as outras foram ter com o moço. E um dia, todas disseram:
"Amanhã, se ele não quiser uma de nós, nós o mataremos"
O moço ouviu só, contam, e riu-se.
Na noite seguinte, o moço foi ao porto diazinho ainda. Ele soprou uma chuvinha fina. Quando as moças desceram, viram fumaça grande. Quando entraram na fumaça procurando o moço, não o encontraram.
De madrugada, veio o vento grande, que limpou a fumaça. E uma das moças gritou:
"Eh, eh, eh...ele desapareceu!"
Ficaram todas tristes. Mas foram dormir.

Texto extraído e adaptado do livro Lendas do Índio Brasileiro, organizado por Alberto Costa e Silva. Ediouro. Lenda Publicada por Antônio Brandão de Amorim no livro "Lendas em Nheêgatu e em Português", in Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, tomo 100, volume 154, Rio de Janeiro, 1928.